de facas viradas para o abismo do seu próprio corpo, o malabarista desfalece no chão e poucos segundos depois, o alvo pára lentamente de rodar... parece adivinhar de que é feito os sonhos dos trabalhadores do circo... uma ciência fingida de quem distorce a realidade para que ela se ajuste à sua visão e a vida parecer um lugar menos estranho.

sabe a cinzeiro... e pela boquilha de prata que ostenta na boca e acende majestosamente o cigarro enquanto se desembaraça da luva comprida pelo esticar da ponta dos dedos... o púrpura lembra o fulgor que ambos despositamos quando estranhamente sós um abraço nos une... e nisto apetece ter 24 ou 25 anos... ou quem sabe 30... ou mesmo, porque não, velho! com assistência do inatel ao domicílio para chás de lima e digestivos ;)

e segue o desfile de nomes sonantes! de muita tradição folclore e bom nome... nomes compridos pois então! com de's e muitos e's e outros que servem mais para ganhar ar do que para lembrar uniões marcantes... atrás ouve-se um coro... cantam em latim, língua que poucos percebem a não ser talvez o magnífico reitor. atrás dele, a fazer lembrar grandes personagens dos descobrimentos portugueses, há prosa e doutores. gente com beca e togas e aparência de altos funcionários de outras nações que não a nossa, mas que a nossa acolhe e acomoda, quase como de uma festa do Zimbabwe se tratasse...

e julgo ouvir: "joão aleluia"... dois nomes de majestosa vulgaridade para um homem de dois metros e tanto, que marcha pelo palco acima... e o coro agita-se em busca de mais... julgo ouvir o "aah aah ahhaahhh leeluiaaaah aah aah leluia... aleluia! aleluia aleluiaaaaaaa! aah aah leluia... aleluia!!" tudo isto crescente! e trompetes ao fundo... como elefantes que se juntam ao palco pelos corredores laterais!

do espelho do táxi, o motorista procura um rapaz com certezas... ele desvia o olhar e fita a lua à espera de respostas... a lua sabe do que fala quando cheia rouba as estrelas ao céu e centra em si o protagonismo de final de noite que recusaríamos noutras circunstâncias... apetece ficar à espera, esperar que o sol nasça... e que a repetição das palavars que trocamos não seja sinal de vazio... e esperamos...

noites com picapaus de asas grandes! altos e de vôos picados... sabe bem ocupar a inutilidade do tempo, os resquícios do que fomos e misturar a isto álcool, prosa e silêncios... sim silêncios. muitos! daqueles que protejam a nossa solidão... poetas da bica que se vendem por pouco, porque esse pouco faz deles muito.

Selou a carta e de sorriso bem rasgado enfiou-a no marco de correio. Não escrevia qualquer morada nem direcção apenas aquele nome francês que assinava o livro que mudara a vida dele... tinha medo de se tornar num papagaio intelectual saltitante entre piratas mais cativantes que outros... mas sentia-o de cada vez que conhecia alguém mais interessante... e um dia conheceu o mesmo rapaz que mudara a visão do mundo desse senhor francês... e sentiu que devia ceder ao pedido final e escreveu-lhe: "Encontrei o principezinho!..."

era uma dádiva clássica porque chegavam milhares de cartas ao correio de Saint-Exupéry... estaria ele em todo o lado? não... afinal havia um pouco do principezinho em cada um de nós :)