em busca de mim

Thursday, February 17, 2005

de pouco me lembro...

Receio mesmo que os poucos flashes que guardamos embarquem numa viagem sem regresso aparente...
talvez porque todos nós sejamos feitos de histórias, de pequenos excertos de livros entreabertos...
É gentil e ao mesmo tempo frágil a decisão que consagramos quando pegamos no nosso livro e o mostramos a outros... uns chamam partilha, outros reconhecem na palavra um eterno medo...

gosto de ler livros dos outros... permite-me conhecer o autor que rege o meu livro... é estranho, mas encontro aí verdades de escritas que não são as minhas e relativizam o que escrevi e o que escrevo...

Leio nas entrelinhas como devoro olhares de desconhecidos e nunca acho o poeta que me dirige, o compositor que me abana os sentidos e os difunde nas palavras que troco e esqueço...

e nasce em mim a vontade de abrir o meu próprio livro que escondo, que é meu... recordo uma estranha premissa: "a minha vida é um livro aberto, com folhas soltas pelo chão..."

o meu livro não o acho, é um livro em branco, vago e fechado guardado junto ao pó do meu coração...

de muito me esqueço...

2 Comments:

  • No meu entender andas a precisar de ler mais:

    Não sei quantas almas tenho

    Não sei quantas almas tenho.
    Cada momento mudei.
    Continuamente me estranho.
    Nunca me vi nem achei.
    De tanto ser, só tenho alma.
    Quem tem alma não tem calma.
    Quem vê é só o que vê,
    Quem sente não é quem é,

    Atento ao que sou e vejo,
    Torno-me eles e não eu.
    Cada meu sonho ou desejo
    É do que nasce e não meu.
    Sou minha própria paisagem,
    Assisto à minha passagem,
    Diverso, móbil e só,
    Não sei sentir-me onde estou.

    Por isso, alheio, vou lendo
    Como páginas, meu ser.
    O que segue não prevendo,
    O que passou a esquecer.
    Noto à margem do que li
    O que julguei que senti.
    Releio e digo: "Fui eu?"
    Deus sabe, porque o escreveu.

    Fernando Pessoa

    By Anonymous Anonymous, At 10:17 AM  

  • LIBERDADE
    (Interpretado na voz de João Villaret)

    Ai que prazer
    não cumprir um dever.
    Ter um livro para ler
    e não o fazer!
    Ler é maçada,
    estudar é nada.
    O sol doira sem literatura.
    O rio corre bem ou mal,
    sem edição original.
    E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
    como tem tempo, não tem pressa...

    Livros são papéis pintados com tinta.
    Estudar é uma coisa em que está indistinta
    A distinção entre nada e coisa nenhuma.

    Quanto melhor é quando há bruma.
    Esperar por D. Sebastião,
    Quer venha ou não!

    Grande é a poesia, a bondade e as danças...
    Mas o melhor do mundo são as crianças,
    Flores, música, o luar, e o sol que peca
    Só quando, em vez de criar, seca.

    E mais do que isto
    É Jesus Cristo,
    Que não sabia nada de finanças,
    Nem consta que tivesse biblioteca...

    Fernando Pessoa

    By Blogger smiling ghost, At 6:30 PM  

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